Líderes indígenas afirmaram que duas crianças Yanomami, de 1 e 5 anos, teriam sido encontradas mortas na comunidade de Palimiú após o ataque armado de garimpeiros contra indígenas, na Terra Indígena Yanomami em Roraima, no dia 10. A informação foi divulgada em nota pública pela Associação Yanomami Hutukara. Há também relatos de novo ataque de garimpeiros na noite deste domingo (16).
Segundo a entidade, na segunda-feira passada (10), quando o ataque dos garimpeiros à comunidade começou, todos saíram correndo para se proteger dos tiros e muitas crianças acabaram se perdendo no mato e ficaram desaparecidas. No dia seguinte (11), algumas crianças foram encontradas, com a exceção de dois meninos.
Na quarta-feira (12), os indígenas teriam encontrado os corpos dos dois meninos na água, sem vida e, segundo relataram, as crianças estavam afogadas. “À tarde [no sábado], em reunião com o Ministério Público Federal [em Boa Vista], as lideranças puderam dar mais detalhes do que se passou na comunidade e relataram que duas crianças morreram após o tiroteio iniciado no dia 10”, diz o comunicado da Hutukara.
A entidade relatou que, “neste momento, a comunidade de Palimiú está sem nenhuma assistência de saúde: os profissionais de saúde foram removidos por conta dos tiroteios. Também não tem nenhuma força pública de segurança permanente no local, e os garimpeiros continuam diariamente amedrontando a comunidade”.
A Hutukara denunciou que ontem à noite que recebeu ligação da comunidade de Palimiú comunicando novo ataque de garimpeiros à comunidade, que está sem força de segurança permanente da União no local, conforme determinou a Justiça Federal na semana passada.
“Segundo disseram os Yanomami, eram 15 barcos de garimpeiros se aproximando contra a comunidade. Os Yanomami disseram que além dos tiros, havia muita fumaça e que seus olhos estavam ardendo, indicando o disparo de bombas de gás lacrimogênio contra os indígenas”, relatou a associação.
Decisão judicial
Decisão expedida pela Justiça Federal no dia 13 de maio determinou que a União mantenha efetivo armado de forma permanente na comunidade Palimiú para evitar novos conflitos e garantir a segurança de seus integrantes. Também foi determinada à Fundação Nacional do Índio (Funai) que auxiliasse as forças de segurança no contato com os indígenas e no gerenciamento das relações interculturais.
A Polícia Federal informou que uma equipe de policiais estava no local desde quinta-feira (13) cumprindo a decisão, mas que saiu de lá neste final de semana. Hoje (17) não há efetivo na PF fazendo a segurança da comunidade, conforme informou o órgão à Agência Brasil.
A Funai informou que segue acompanhando, junto às autoridades policiais, a apuração de supostos conflitos ocorridos recentemente nas terras Yanomami, em Roraima. O órgão afirmou que mantém equipes de forma ininterrupta dentro da terra indígena, por meio de suas Bases de Proteção Etnoambiental (BAPEs).
“A Funai conta com duas bases localizadas em pontos estratégicos da Terra Indígena Yanomami, que promovem ações contínuas e permanentes de vigilância, fiscalização e monitoramento territorial, a fim de combater ilícitos na região e impedir a entrada de não indígenas nas aldeias”, disse a Funai, em nota. Segundo os indígenas, nenhuma das bases fica dentro ou nas proximidades de Palimiú.
Ofício
A Hutukara emitiu ofício nesta segunda-feira (17) sobre a insegurança a que a comunidade está submetida. Assinado pelo vice-presidente da Hutukara, Dário Vitório Kopenawa Yanomami, o documento foi enviado à Polícia Federal, ao Ministério Público Federal (MPF), ao Exército e à Funai.
No ofício, a entidade solicita a instalação de um posto avançado emergencial na comunidade de Palimiú, com o objetivo manter a segurança no local e no Rio Uraricoera, e que o Exército brasileiro, por meio da 1ª Brigada de Infantaria da Selva, promova apoio logístico imediato para ações dos demais órgãos públicos para garantir a manutenção da segurança no local.
Em 10 de maio, dia do ataque dos garimpeiros à comunidade, a Hutukara enviou ofício aos mesmos órgãos, pedindo que atuassem para “impedir a continuidade da espiral de violência no local e garantir a segurança para a comunidade Yanomami de Palimiú”.
O Ministério da Defesa disse, em nota, que “respondeu prontamente quanto ao envio de tropas para a região e ao apoio à Polícia Federal, após decisão judicial emitida à União” e que “tem colaborado com as ações necessárias ao cumprimento da decisão judicial”.
A Agência Brasil procurou o Ministério da Justiça e Segurança Pública e a Advocacia-Geral da União sobre o cumprimento da decisão judicial e o deslocamento de efetivo de segurança no local e aguarda retorno.
Histórico
A comunidade Palimiú, localizada dentro do território Yanomami em Roraima, foi alvo de ataque de garimpeiros com armas de fogo contra a comunidade Palimiú na última segunda-feira (10). De acordo com informações da Associação Yanomami Hutukara, ao menos cinco pessoas ficaram feridas, sendo quatro garimpeiros e um indígena.
Policiais federais também foram alvo de disparos no local, na terça-feira passada, quando estiveram na comunidade para apurar o ataque dos garimpeiros. No momento em que a equipe estava prestes a embarcar da comunidade com destino de volta a Boa Vista, uma embarcação de garimpeiros passou no Rio Uraricoera efetuando os disparos. A equipe se abrigou e respondeu à agressão. Não houve registro de atingidos de nenhum dos lados.
Risco aos indígenas
O MPF já alertou para os riscos dos indígenas na região. “Esse tipo de conflito tem sido alertado pelo MPF em diversos procedimentos, inclusive com ações na Justiça Federal pedindo um plano de retirada de garimpeiros, temendo possível genocídio. A Justiça já até decidiu a favor do MPF e da retirada do garimpo ilegal na TIY”, disse o MPF.
Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Indígena Yanomami tem 9,6 milhões de hectares entre os estados de Roraima e Amazonas, onde vivem mais de 27 mil indígenas espalhados em cerca de 331 comunidades. Essa terra indígena foi homologada em 1992 e a atividade de garimpo nela é ilegal.
Metade da população desse território – um total de 13.889 indígenas – mora em comunidades a menos de 5 quilômetros de uma zona de garimpo, segundo levantamento divulgado pelo Instituto Socioambiental. A estimativa é que mais de 20 mil garimpeiros entram e saem dos territórios indígenas yanomami sem nenhum controle.