Ex-chefe do PNI defende vacinas e campanhas de controle da pandemia



A Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia (CPI) do Senado ouve, nesta quinta-feira (8), Francieli Fantinato, ex-coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI), do Ministério da Saúde. Servidora de carreira, ela é enfermeira e tecnologista da pasta desde 2015. Amparada por decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), a depoente se negou a prestar compromisso de dizer a verdade aos parlamentares.

Em sua declaração inicial, ela ressaltou seu currículo acadêmico, com especialização em eventos adversos pós-vacina. Segundo Francieli Fantinato, o programa brasileiro de vacinação, o maior do mundo, teve dificuldade porque faltaram doses suficientes de imunizantes para a execução rápida de uma campanha. “Trabalhei incansavelmente 24 horas por dia, sete dias por semana, para vacinar a população brasileira. Para um programa de vacinação ter sucesso é simples: é necessário ter vacinação e é necessário ter campanha publicitária efetiva. Infelizmente, eu não tive nenhum dos dois”, ressaltou.

Saída da coordenação do PNI

À CPI, a depoente disse que o pedido dela para deixar a coordenação do PNI foi motivado pela “politização do tema”. “Quando nós temos todas as evidências favoráveis, as evidências que mostram que a vacinação é um meio eficaz para que a gente possa controlar a pandemia, qualquer indivíduo, qualquer pessoa que fale contrário à vacinação vai trazer dúvidas à população brasileira. Então, há necessidade de se ter a comunicação única, seja de qualquer cidadão, de qualquer escalão”, justificou.

Grupos prioritários

Enquanto foi coordenadora do Programa Nacional de Imunizações, cargo do qual teve a exoneração publicada ontem (7) no Diário Oficial da União, Francieli Fantinato disse ter sofrido pressão “de diversos setores” para inclusão de grupos prioritários na vacinação. Tais pressões, pontuou, teriam atrapalhado a campanha de imunização no Brasil.

Perguntada pelo relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), sobre que problemas teve nesse sentido, ela citou a vacinação de profissionais de saúde. “Primeiramente, a manutenção da força de trabalho do setor de saúde, porque a gente precisava que esses profissionais estivessem vacinados para poder atender à população brasileira. Na sequência, aqueles que mais morriam, por morbidade e mortalidade. E, na sequência, a manutenção do funcionamento dos serviços essenciais. Então nós colocamos esses grupos prioritários e tivemos pressões para mudar esses grupos”, relatou.

Aos senadores, a ex-coordenadora enfatizou que a definição dos grupos prioritários foi feita pela Câmara de Assessoramento Técnico, formada por diversas sociedades científicas “que estudam o tema e entendem o conjunto epidemiológico”. Franciele Fantinato insistiu que todos os problemas foram gerados pela falta de doses. “Se tivesse vacina suficiente, não precisaria fazer essa fragmentação, nós evitaríamos toda essa pressão de todos os segmentos porque a gente daria início a uma campanha com uma quantidade maior de doses”, afirmou.

Ainda sobre a estratégia de vacinação contra a covid-19, outra informação trazida pela enfermeira é que durante reunião que discutiu a versão final do plano de imunização contra o novo coronavírus, o então secretário executivo da pasta, Elcio Franco, solicitou que fosse retirada a população privada de liberdade, que também estava na estratégia. Na ocasião, Francieli disse que se negou a atender à solicitação e disse que se a população privada de liberdade fosse retirada da lista de prioridades seria com documento sem o aval oficial do programa.

Franco também foi citado por Francieli no contexto da adesão do Brasil ao consórcio Covax Facility. O Brasil poderia ter optado por receber uma quantidade de doses suficiente para imunizar 50% da população. Mas esse percentual foi definido em 10% da população. “Fizemos uma nota técnica inicial do Covax com o mesmo teor da nota técnica que nós fizemos para a AstraZeneca, apontando que tinha necessidade de vacinar dentro dos cenários ou 55% da população até 95%, num cenário de incerteza. Depois veio o contrato fechado, para que a gente se manifestasse, por uma nota técnica, qual seria o grupo a ser atendido com aqueles 10%”, contou a ex-coordenadora do PNI.

Segundo ela, à época da definição do percentual, Elcio Franco disse que “não tinha como colocar todos os ovos na mesma cesta”. O ex-secretário executivo já prestou depoimento à CPI, em 9 de junho. Na ocasião, Franco, que atuou na gestão do então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, disse que sempre foi orientado para que adquirisse o maior número de doses de vacinas, no menor tempo possível, desde que o imunizante fosse aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Gestantes

Franciele Fantinato foi convocada após ser citada pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, na CPI. Segundo ele, a então coordenadora editou nota técnica destinada aos estados, recomendando que gestantes que tinham recebido a primeira dose da AstraZeneca tomassem a segunda dose de qualquer outra vacina, sem nenhuma comprovação de segurança ou eficiência. Em sua defesa, ela levou à CPI bulas de várias vacinas contra a covid-19 e ressaltou que nenhuma delas aponta “contraindicação para gestantes”, mas “precauções”.

“Por causa do grave cenário epidemiológico, em que grávidas estavam morrendo, orientamos a vacinação das grávidas, com toda a responsabilidade necessária a este grupo”, explicou. Ela acrescentou que uma análise do risco versus benefício foi feita em reunião com a Câmara Técnica de Assessoramento.

Ainda segundo Francieli, logo depois da decisão uma gestante do Rio de Janeiro que tinha recebido uma dose da Pfizer morreu. Por causa disso, os técnicos do governo reavaliaram a situação e decidiram pela intercambialidade de vacinas. Dessa forma, a segunda dose poderia ser de uma marca diferente da primeira. Segundo ela, hoje já se comprovou na prática que o conceito de intercambialidade traz mais benefícios do que deixar a pessoa sem cobertura vacinal. A informação foi contestada pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), que disse que não há nenhum estudo no mundo com testes especificamente em gestantes e puérperas.

Nota técnica

Durante o depoimento, a ex-coordenadora do PNI leu uma nota técnica de 17 de fevereiro do Ministério da Saúde. À época, o documento alertava que a Covaxin ainda não tinha dados sobre sua eficácia publicados, nem liberação da Anvisa. Por isso, o PNI solicitou na ocasião que fossem pedidos à Bharat Biotech, produtora da vacina, os dados sobre eficácia e segurança, além de estratégias da empresa indiana para atualizar a vacina, a partir do surgimento de novas variantes.

A nota chamou a atenção do relator. “As vacinas da Pfizer, a CoronaVac e as recomendadas pela OMS [Organização Mundial da Saúde] tinham os mais rigorosos controles e compliance. Mas o governo priorizava na ocasião a única vacina que tinha um atravessador, a empresa Precisa. Se tivesse dado a mesma prioridade às demais vacinas, quando oferecidas, mais de 300 mil vidas teriam sido salvas” observou.

Testemunha

Em função do esclarecimento de fatos considerados relevantes para a comissão, o relator Renan Calheiros disse que retiraria o nome da ex-coordenadora do PNI da condição de investigada pela CPI e passaria a tratá-la como testemunha. A decisão provocou a reação de senadores da base do governo. “A partir do momento que a testemunha chega aqui e passa a falar em uma linha que a oposição acha que vai ao encontro do que eles querem, eles modificam”, criticou Marcos Rogério (DEM-RO). Por causa da polêmica, a decisão foi submetida ao plenário da CPI, que aprovou o encaminhamento. A maioria dos senadores também decidiu suspender os efeitos da quebra de sigilos telefônico e telemático.
 

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