Marcelo Henrique
É muito interessante como frases de efeito estão sempre presentes em nosso cotidiano. Muitas vezes, inclusive, parece que surgem como uma mensagem para nos instruir diante de determinada situação. Quem nunca anotou, ou tirou uma foto daquelas notáveis inscrições nos para-choques de caminhão? Muitas delas são verdadeiras reflexões sociais e filosóficas que os nômades das estradas compilam dos mais variados lugares e replicam nas dependências de seus carros.
A expressão que intitula esse artigo, por exemplo, adveio de uma agradável conversa em um daqueles aplicativos de mensagens. Em dado momento cujo contexto orbitava em torno de escolhas com implicações carregadas de valorações ético-morais, essa frase surgiu como preâmbulo de uma resposta importante ao deslinde da problemática. Qual seria o limite tolerável do altruísmo, sem ofender a subjetividade? Uma questão bem complexa, talvez um dos grandes dilemas da vida das pessoas de bem, o qual – ao meu ver – suporta duas linhas de interpretação.
Se analisado sob o prisma da Psicanálise, a sobreposição do alterego – o “eu” do outro – ao ego – o “eu” próprio – implica em entregar a subjetividade a outrem, que a sequestra de forma velada, fazendo exsurgir no altruísta o que chamamos de Síndrome de Estocolmo, onde esse liame entre ego e alterego torna-se enrijecido por forças bem distantes do amor. A ligação torna-se orgânica, alicerçada no comodismo da convivência, ou – em casos mais grave – no medo da dissolução do vínculo, muitas vezes compreendido como de vital importância para a sobrevivência. Como lacaniano que sou, entendo que a ruptura se apresenta como único caminho a ser experimentado em hipóteses como essa. Afinal, o ego saudável é premissa maior para qualquer tocante ao outro, ainda que em movimento altruísta. Não se pode dar ao outro aquilo que não se tem.
Quando o tema adentra às linhas da Filosofia, despreocupada com a finalidade útil de sua solução, mas com ênfase na compreensão do fenômeno, eu citaria o alemão Schopenhauer, em especial na sua releitura de Immanuel Kant. O dualismo kantiniano, que se resumiria no mundo dos fenômenos suscetíveis de serem experimentados pelo Homem e no universo incognoscível – a coisa, em si, que não suporta a experiência humana – sofre uma atualização, ao meu ver brilhante, de Schopenhauer quando acrescenta uma terceira via, consubstanciada da união harmoniosa entre a “coisa” e fenômeno, dentro do tempo e do espaço. Mais do que pessimismo, como diriam alguns mais incautos, prefiro chamar de temperança, em uma modalidade mais complexa do que a clássica, já há idos tempos defendida por Aristóteles.