“Olá, como vai? Eu preciso saber da sua vida. Como vai você? Salve, simpatia”. É com uma colagem de trechos de diversas canções brasileiras que a nova exposição temporária do Museu da Língua Portuguesa vai saudar o público que a visitar a partir desta sexta-feira (14), em São Paulo.
Chamada de Essa Nossa Canção, a mostra explora a ligação entre a língua portuguesa e a música brasileira. Uma ligação tão profunda que é responsável por construir não só a nossa identidade, como também a memória coletiva.
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“Todos nós temos as nossas canções. Aquilo que entra em você e resgata um sentimento, como uma dor ou uma alegria. Mas o Brasil também tem as suas canções. Então, a canção também define uma identidade”, diz Isa Grinspum Ferraz, uma das curadoras da exposição junto com Carlos Nader e Hermano Vianna. A mostra também tem consultoria de José Miguel Wisnik.
“Com a exposição queremos mostrar a diversidade das canções no Brasil, os vários falares, as múltiplas vozes que podemos ouvir através das canções e que une classes sociais, o popular e o erudito, o individual e o coletivo”, acrescenta Isa.
Percurso do sopro
A colagem de versos de diversas músicas que saúdam o público faz parte da instalação sonora Palavras Cantadas, que compõem o primeiro momento da exposição. Nela, o visitante vai entrar em uma sala repleta de cortinas e 14 caixas de som acústicas, que apresentam versos de 54 músicas brasileiras, despidas de acompanhamento instrumental. É aqui que esses versos conversam entre si e criam uma nova e transformadora obra, elaborada pelo produtor cultural Alê Siqueira.
Com isso, versos de canções de Adoniran Barbosa vão brincar e interagir com trechos de músicas de Chico Buarque, Martinho da Vila, João Gilberto ou Clara Nunes, em uma experiência que dura pouco menos de seis minutos.
Mas a exposição tem início antes dessa sala. Já ao entrar no elevador, o público vai ouvir uma intervenção sonora, também criada por Alê Siqueira, e que reúne cantos famosos como Ôôôôô, Ilariê, Aê-aê-aê, que se unem para formar uma única canção.
Garota de Ipanema
Já na segunda sala da exposição, dez músicas emblemáticas do cancioneiro nacional ganham novos intérpretes, promovendo ligações inusitadas entre as interpretações clássicas e a música brasileira contemporânea. Juçara Marçal, por exemplo, canta Sinal Fechado, de Paulinho da Viola. José Miguel Wisnik e Xênia França cantam Garota de Ipanema, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes. E fãs dos Racionais MC’s cantam o clássico rap Diário de um Detento. “É importante dizer que não são as 10 melhores canções brasileiras. É sempre um recorte. Essas canções estão aí porque elas trazem algum aspecto inusitado ou desconhecido da relação entre língua e canção”, explica Isa.
O terceiro ambiente da exposição é dividido em dois espaços. Em um deles, o público terá a oportunidade de assistir ao documentário As Canções (2011), de Eduardo Coutinho. No outro, os cineastas Quito Ribeiro e Sérgio Mekler realizam obra inédita composta por pequenos trechos de músicas que estão em vídeos do YouTube com interpretações de diversas músicas brasileiras.
Na última sala da exposição, há reproduções dos manuscritos de canções escritas pela cantora sertaneja Marília Mendonça, o músico Tom Jobim e o sambista Cartola. Há, ainda, uma linha do tempo em que são apresentados aparelhos que reproduziram essas canções brasileiras ao longo dos anos, desde a vitrola, ao disco de 78 rpm, passando pelas fitas K7 e os iPods.
A ideia da exposição é que o público faça o percurso como um sopro. Um sopro que vai se adensando e ganhando forma, corpo e elementos.
“A canção é um sopro. E, no Brasil, é um sopro que oxigena e que reúne características da identidade brasileira, que é vastíssima, e da multiplicidade de Brasis que não é um país, mas [são] muitos. A canção une todas as pontas do Brasil. Une o erudito e o popular, o antigo e o mais moderno. É sempre uma recriação: você bebe da tradição, mas a reinventa o tempo todo. E você une classes sociais. Você pode contar a história do Brasil e todo mundo se identifica com ela, de algum jeito, através da canção. Cada um de nós tem canções que também traduzem nossas vidas. De fato, estão na alma do brasileiro a música e a canção”, analisa Isa.
Experiência sensorial
Segundo Carlos Nader, a exposição foi toda pensada curatorialmente para ser uma experiência sensorial. “Essa não é uma exposição sobre a história da canção. Não há nenhuma ambição totalizante nesse sentido de fazer uma tese sobre a canção. É uma exposição sensorial, fluída. Ela não é para ser entendida racionalmente, mas para ser sentida, aproveitada, como é a própria canção. A canção é esse sopro. A gente esquece que a fala é sopro, um sopro contínuo, cortada pelas cordas vocais. E a canção é esse sopro potencializado por um ritmo musical”, depõe.
A mostra Essa Nossa Canção fica em cartaz até março de 2024. O museu tem entrada gratuita aos sábados. Mais informações podem ser obtidas no site do museu.