ESPETÁCULO “ARREPSIA” É UM SOCO NOS BONS COSTUMES

Crédito: Gui Guimaraens.


Trabalho da IncompetênCia – Incompetente Cia. de Teatro cumpre temporada em BH, entre 28 de outubro e 11 de novembro, e traz à tona reflexão sobre ancestralidade, identidade de gênero e raça 

Provocativo e potente, o espetáculo “Arrepsia” é uma voadora nos bons costumes. Afinal, a jovem e enérgica IncompetênCia – Incompetente Cia. de Teatro, formada por Gabi Vieira, Malu Dimas, Rafa Calú e Sarah Vá, debate diante do espectador, a partir de um âmbito trabalhista, a tentativa de invisibilização de sua  ancestralidades, relações de gênero e de raça. A peça, que cumpriu sua primeira temporada em julho de 2022, mas que pela primeira vez vai realizar uma circulação em Belo Horizonte, poderá ser conferida em três espaços distintos: Centro Cultural São Geraldo (28 e 29 de outubro – entrada franca), Zap 18 (4 de novembro – ingressos a R$ 15) e Centro Cultural Venda Nova (10 e 11 de novembro – entrada franca).

“Arrepsia” é autoetnográfico (relação do indivíduo com o meio sociocultural em que está inserido). Ou seja, o espetáculo parte da história de Calú, Gabi, Malu e Sarah, que, embora já atuassem na área teatral, precisaram trabalhar em outras funções, uma delas enquanto garçonetes, para buscar o sustento. Essa necessidade se deu por conta do sucateamento das políticas públicas culturais e da monopolização das verbas de fomento artístico por entidades já estabelecidas. O elenco ainda se viu diante da falta de dramaturgias que contemplassem sua existência enquanto “corpas” plurais. “Buscamos refletir a realidade de grande parte de atrizes e de atores brasileiros, que não conseguem viver de sua arte e acabam tendo que buscar outras alternativas para se sustentar, mas, mesmo estando em um ambiente de bar, a gente não consegue deixar de criar e refletir nossos sonhos”, declara Malu Dimas, afirmando que o espetáculo reflete “os corres diários” do povo brasileiro.

A partir desse cenário, as atrizes se viram diante da urgência de criar a companhia IncompetênCia – Incompetente Cia. de Teatro, na qual pudessem desenvolver metodologias teatrais autorais, possibilitando a criação de dramaturgias que englobassem suas inquietações em cena. Logo, a desvalorização dos profissionais de teatro, assim como a invisibilidade do trabalhador brasileiro, são os azeites do espetáculo “Arrepsia”, que é um prato cheio para quem tem fome de arte reflexiva. “Arrepsia é leve, poético, boêmio, engraçado, político e dramático, tudo na mesma intensidade. E se isso tudo não te convenceu a assistir, durante o espetáculo, tem breja de graça”, brinca Gabi Vieira.

A criação e a dramaturgia de “Arrepsia” são autorais, criadas coletivamente pela IncompetênCia – Incompetente Cia. de Teatro. O espetáculo conta com a direção de Tiago Agar, direção musical de Talita Sanha e  provocação artística de Ernani Maletta, artistas convidados pelo grupo. Aprovada no edital Descentra, a circulação de “Arrepsia” é realizada com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte. “Apresentar esse espetáculo em regiões periféricas é retornar à origem, é reconhecer a nossa casa e a nossa comunidade como precursoras da arte e cultura”, celebra Rafa Calú, salientando que a temporada vai contribuir com a fruição artística e com o acesso à cultura na capital mineira.

ENREDO

Em cena, o público estará diante de quatro garçonetes. Todas elas são atrizes, e todas elas estão ralando pelo sustento, já que viver da arte ainda é um horizonte distante. Entre um atendimento e outro, o quarteto debate sobre negritude, gênero, classe social e, claro, sobre o contexto trabalhista de um país latino-americano. Apesar da intensidade dos temas abordados, a IncompetênCia – Incompetente Cia. de Teatro é debochada, usa e abusa da ironia-crítica  para passar o recado. O público um, nesse universo, é o cliente do bar. Ou seja, o espetáculo é sensorial, intimista e imersivo.

CURIOSIDADES
“Arrepsia” foi apresentado como trabalho de conclusão de curso da atriz Malu Dimas, durante o bacharelado em teatro pela Escola de Belas Artes da UFMG, em 2022. Logo depois, a artista foi aprovada em um teste de elenco e passou a integrar a novela “Amor Perfeito”, da Globo, em que deu vida a personagem Adélia Batista. O folhetim, escrito por Duca Rachid, Elísio Lopes e Júlio Fischer e dirigido por André Câmara, foi exibido em 2023.

Nas duas primeiras sessões desta temporada de “Arrepsia”, nos dias 28 e 29 de outubro, no Centro Cultural São Geraldo, com entrada franca, o elenco da IncompetênCia – Incompetente Cia. de Teatro realizará um bate-papo com Dona Raimunda, que é representante da comunidade do São Geraldo e avó de Malu Dimas. Dona Raimunda, a propósito, foi pivô para a construção dramatúrgica do espetáculo.

COMPANHIA
A IncompetênCia – Incompetente Cia. de Teatro é formada por quatro artistas que se conheceram no Teatro da Escola de Belas Artes, da UFMG. A consciência acerca das problemáticas vividas por elas e o desejo de mudar essa realidade foi o ponto de união entre o grupo, assim como a pesquisa sobre as suas identidades.O próprio nome do grupo, IncompetênCia, é um flerte com a denominação pejorativa na qual as artistas eram classificadas pela imposição cisnormativa branca e burguesa. Além de “Arrepsia”, o grupo assina o projeto audiovisual “Histórias de Quintal” e o ciclo formativo “Recontando a Nossa Contagem”, ambos executados no ano de 2021. Após a atual temporada de “Arrepsia”, o quarteto voltará para a sala de ensaio, tanto para o desenvolvimento de um espetáculo inédito e de produções de audiovisual, quanto para traçar os planos de levar “Arrepsia” para outros territórios nacionais e internacionais.

SERVIÇO

“Arrepsia”, da IncompetênCia – Incompetente Cia. de Teatro

28 e 29 de outubro, às 19h

Centro Cultural São Geraldo (rua Silva Alvarenga, 548, São Geraldo)

Entrada franca (ingressos distribuídos no local uma hora antes da apresentação)

4 de novembro, às 19h

ZAP 18 (rua João Donada, 18, Santa Terezinha)

R$ 15 (inteira) e R$ 7,50 (meia-entrada)

10 e 11 de novembro, às 19h

Centro Cultural Venda Nova (rua José Ferreira dos Santos, 1843, Jardim dos Comerciários)
Entrada franca (ingressos distribuídos no local uma hora antes da apresentação)

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