Romero Jucá, ministro do Planejamento e homem forte do governo interino de Michel Temer, anunciou seu licenciamento do cargo após a divulgação de gravações em que fala sobre um possível “pacto nacional” para barrar as investigações da Operação Lava Jato.
“Caberá ao presidente me reconvidar ou não. (…) Meu gesto é que somos transparentes e nada temos a esconder”, disse Jucá a jornalistas.
Revelados pela Folha de S. Paulo, os áudios contêm diálogos entre Jucá – um dos principais aliados de Temer no processo que o levou ao poder interino – e o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado.
“Tem que resolver essa porra. Tem que mudar o governo para estancar essa sangria”, diz Jucá em um trecho da gravação de março passado, segundo a Folha. Ele fala também em um pacto nacional “com o Supremo, com tudo. (…) Delimitava onde está, pronto”, em suposta referência às investigações.
Em entrevista coletiva nesta segunda-feira após a divulgação do áudio (mas antes de se licenciar), Jucá disse que se referia “à sangria da economia”, e não à operação anticorrupção na Petrobras, e que “sempre apoiou e defendeu” a Lava Jato.
“Quero repelir a interpretação feita pela Folha de S. Paulo. (…) Eu falava em estancar a paralisia do Brasil, estancar a sangria do desemprego, separar (os políticos) que têm culpa dos que não têm culpa”, disse Jucá, negando que pretenda renunciar. “Reafirmo meu compromisso no Ministério do Planejamento e vou exercer (o cargo) enquanto entender que tenho a confiança do presidente.”
Jucá sempre foi um dos nomes certos para o ministério do presidente interino. Ainda assim, o anúncio dele para a pasta do Planejamento foi um dos mais criticados, já que o peemedebista é um dos investigados pela Lava Jato.
Jucá é citado mais de uma vez como uma das pessoas que supostamente recebeu propina no esquema de corrupção da Petrobras. Ricardo Pessoa, empreiteiro da UTC Engenharia, afirmou em delação que o peemedebista teria pedido R$ 1,5 milhão à empresa em doação para a campanha eleitoral de 2014, em que seu filho era candidato a vice-governador de Roraima.
A doação teria vindo em forma de propina pela contratação da UTC para a construção da usina nuclear Angra 3.
Há um inquérito em curso para investigar a participação do senador no escândalo – algo que ele nega veementemente. “Não tenho nenhum temor em ser investigado”, reafirmou Jucá na coletiva desta desta segunda. “Se tivesse telhado de vidro não teria assumido a presidência do PMDB. (…) Considero a Lava Jato uma mudança positiva na política brasileira, tanto que no Senado votei pela recondução (do procurador-geral da República) Rodrigo Janot e acho que o Ministério Público Federal deve ter autonomia para investigar.”
Mas Jucá não é alvo somente da Lava Jato. O senador é suspeito de ter participado também do esquema de corrupção investigado na operação Zelotes, que investiga aparentes interferências em julgamentos realizados no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), beneficiando empresas endividadas com o Fisco.
Uma das delações de um ex-servidor da Receita Federal, João Gruginski, inclui a informação de que o lobista Alexandre Paes dos Santos teria mencionado um pagamento a Jucá e outros políticos, que seria relacionado a um esquema de venda de medidas provisórias favoráveis aos interesses de montadoras de veículos.
O pagamento total seria de R$ 45 milhões, dos quais R$ 15 milhões seriam para “RJ”, a sigla que designava Romero Jucá. O senador, porém, nega a participação no esquema – mas ainda é investigado por ele em inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF).
Acusações passadas
Antes de seu partido romper com o PT em março deste ano, Romero Jucá foi um dos grandes aliados do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e também de Dilma Rousseff.
Em 2005, inclusive, chegou a ser nomeado ministro da Previdência Social de Lula, mas não ficou muito tempo no cargo. Após quatro meses, o senador deixou a pasta devido ao desgaste causado pelas acusações de que teria oferecido ao Banco da Amazônia (Basa) fazendas inexistentes como garantia de empréstimo feito pelo banco à empresa Frangonorte em 1996 – da qual Jucá foi sócio entre 1994 e o final de 1996.
O ministro disse à época que as denúncias eram “levianas” e atribuiu as informações às disputas políticas no Estado de Roraima.
Em 2008, a Procuradora-Geral da União arquivou o caso, apesar de ter identificado irregularidades, porque ele já havia prescrito.
Com a crise política se acirrando no início desse ano, Jucá foi apontado como um dos principais articuladores dentro do PMDB favoráveis ao rompimento do partido com a presidente pelo impeachment.
Em 29 de março, como vice-presidente do partido, ele anunciou a saída da base dizendo: “Estamos vivendo um momento histórico”.
No mesmo dia, em entrevista à BBC Brasil, Jucá disse que o partido tinha de “representar a vontade do povo brasileiro”.
“As condições de governabilidade se exauriram. O Brasil é maior que qualquer entendimento político e qualquer partido tem que representar a vontade do povo brasileiro.”
Quase dois meses depois do rompimento, o impeachment foi aprovado no Senado, Dilma Rousseff foi afastada, e Jucá se tornou uma das pessoas mais próximas ao novo presidente.
Em vídeo divulgado no perfil da presidente afastada Dilma Rousseff no Facebook, Ricardo Berzoini, ex-ministro-chefe da secretaria de governo, afirmou que conversa entre Jucá e Machado “mostra um pretendente a ministro do golpe conversando com uma pessoa que estava sendo investigada e eles tentando tramar para encontrar no impeachment a forma de refrear as investigações e a apuração dos crimes praticados”.
Berzoini disse ainda que é preciso pedir exigir “demissão de Romero Jucá e investigar a relação de Michel Temer com esse diálogo”