Apesar do avanço da vacinação no Brasil, com a primeira dose da vacina contra a covid-19, que já alcançou mais de 50% da população adulta, autoridades de saúde alertam que frente a variante Delta do vírus, os cuidados com as medidas sanitárias não podem ser flexibilizados. O assunto foi tema, nessa sexta-feira (20) de audiência pública da Comissão Temporária da Covid-19 do Senado. Especialistas e senadores debateram riscos e impactos da variante Delta, além do eventual surgimento de outras mutações do novo coronavírus no Brasil.
Segundo o pesquisador e professor de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Guilherme Loureiro Werneck, mesmo em países em que a população está mais acelerada houve um crescimento importante das hospitalizações por covid-19 pela nova variante. “Se nós observarmos a situação desses países, é claro que nós precisamos nos preocupar. Por quê? Porque no Brasil, em momento algum, houve um controle da transmissão comunitária da covid. Nós vivemos várias situações piores do que a atual e melhores do que atual, mas, em todas essas situações, o vírus continua circulando em taxas ainda bastante altas, o número de casos e o número de óbitos ainda são bastante altos”, avaliou o pesquisador.
Werneck acrescentou ainda que no Brasil o número de hospitalizações e óbitos por covid-19 que vinha decrescendo rapidamente, subitamente estacionou e eventualmente pode crescer no futuro. “Se isso é resultado ou não da variante Delta é muito difícil de se falar, mas o fato é que a situação momentânea do Brasil é de muita preocupação e se exige que muitas ações sejam realizadas para conter um eventual recrudescimento dessa pandemia”, alertou.
Outro aspecto levantado na audiência pública, desta vez, pela representante do Programa Nacional de Imunização do Ministério da Saúde, Greice Madeleine do Carmo, é que embora a vacinação diminua o risco de uma doença mais grave, “ela não impede a doença mais grave, ela não impede o risco de a pessoa ter formas leves da doença e transmitir”. Segundo a técnica, mesmo em países como os Estados Unidos, que utilizam vacinas de terceira geração, de RNA mensageiro, como é o caso dos imunizantes da Moderna e da Pfizer, já há registros de internação de pacientes graves infectados pela variante Delta. “A variante Delta desafia todas as vacinas. Eu acho que isso é importante a gente saber, para a gente não ficar centralizando responsabilidades em cima de um ou outro produtor”, destacou a técnica.
Nova dose
Os senadores também quiseram saber sobre a necessidade de mais uma dose de imunizantes contra o novo coronavírus para quem já tomou duas doses. Para Renan Pedra, professor de genética da Universidade Federal de Minas Gerais, pesquisador da variante Delta no estado, está constatado que há uma queda progressiva dos anticorpos nas pessoas. “Isso está sendo visto não só no Brasil como em vários países. Estamos vendo acontecer, de fato, essa perda da proteção após alguns meses da vacinação, em torno de seis meses, principalmente naqueles que respondem pior à vacinação, ou pela idade – há um mecanismo que a gente chama de imunossenescência, não é só o cabelo que fica branco, nosso sistema imunológico também envelhece e nesse sentido a capacidade de resposta às vacinas é menor e tende a ser mais curta – e nos imunodeficientes”, explicou.
Para ele “está muito claro hoje que essas pessoas vão precisar de um esquema melhor”. Segundo Renan Pedra, é preciso diferenciar terceira dose, que é mais uma dose no esquema normal de vacinação para quem responde menos, da chamada dose de reforço, que é posterior para pessoas que responderam bem à vacinação, ficaram protegidas, mas essa proteção foi diminuindo ao longo do tempo. “São duas coisas bastante diferentes a serem discutidas. Está muito claro que um esquema reforçado, ou seja, um esquema de três doses, ou no caso da vacina Janssen, um esquema de duas doses, uma dose adicional, vai ser necessário. Já é evidente que é necessário para os imunodeficientes e para os idosos. Então, isso acho que é um consenso já na ciência”, ressaltou.
Segundo o pesquisador, ainda não há evidências suficientes se todos os vacinados precisarão de reforço na imunização seis meses a oito meses depois do esquema inicial completo. “Essa é uma discussão muito complexa. Eu acho que a gente não teria argumentos exaustivos aqui para estar debatendo. Não existe nenhum consenso na comunidade científica sobre quem vai fazer terceira dose e qual a priorização. Isso é o mais importante: quem é prioridade? A gente vai vacinar adolescentes saudáveis de 12 a 17 anos ou vamos fazer uma terceira dose em pessoas com comorbidades ou que estejam na faixa dos 50 anos? Em um cenário de escassez de vacina, em que a gente não teria que estar fazendo escolha de Sofia, como nós fizemos desde o início dessa vacinação, por falta de vacina, nós tivemos que ir priorizando, o que não é o desejável”, observou.