Lendas e encantarias: cultura paraense expressa na obra de Dona Onete




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A cantora e compositora Dona Onete, de 83 anos, é a homenageada da Ocupação Dona Onete, em cartaz no Itaú Cultural, na capital paulista. A exposição, que conta com 120 itens, entre fotos, vídeos, músicas, manuscritos, e depoimentos, fica em cartaz até 18 de março.

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A Agência Brasil elencou quatro músicas da artista que trazem elementos da história e da cultura do estado do Pará. Culinária, flora, fauna, lendas e encantarias fazem parte do repertório de Dona Onete que, atualmente, é considerada uma das maiores propulsoras da cultura paraense no Brasil e no mundo.

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Balanço do Açaí

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Antes de se mudar para Belém, capital do Pará, a cantora morou em Igarapé-Miri, município do Baixo Tocantins, conhecido como a “capital mundial do açaí”. Daí sua forte relação com a planta.

No álbum Rebujo, de 2019, Dona Onete traz a canção Balanço do Açaí, em homenagem à palmeira símbolo da região amazônica que produz o fruto arroxeado, popularizado no país. Consumido em forma de pirão, suco ou sorvete, o açaí tornou-se parte fundamental da cultura alimentar brasileira.

Além da flora amazônica, a letra também enaltece a fauna brasileira, trazendo pássaros de diferentes regiões do país – o sabiá, a juriti, o rouxinol (como é chamado o corrupião aqui no Brasil, por exemplo), o bem-te-vi, a iraúna e o suí – que fazem uma sinfonia na palmeira do açaí.

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Na raiz da açaizeira, aparecem também as formigas tucandeira e tracuá, ambas com ferrões que podem causar fortes dores nas vítimas de sua picada.

A tucandeira ou watyama, de acordo com o Glossário Lexical da Língua Sateré-Mawé, publicação de Miller Miquiles e Franklin Roosevelt Martins de Castro, é a formiga utilizada em uma das principais celebrações da tribo indígena Sateré-Mawé, que habita a região do médio rio Amazonas. Durante o Ritual da Tucandeira, que marca a passagem do adolescente para a vida

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  adulta, os homens colocam as mãos em uma luva de palha, chamada “sáripe”, infestada de formigas. “O menino passa por um ritual de iniciação da tucandeira, uma passagem da vida adolescência para a vida adulta, para se tornar um grande homem guerreiro, saudável, bom caçador, ser homem forte, sobretudo a ficar imune à várias doenças”, dizem os autores.

Já a tracuá, de acordo com o livro Vamos falar acreanês, de Pedro Ranzi, é uma “formiga preta que tem a propriedade de fabricar certa substância que os índios e seringueiros usam para manter aceso o fogo. A picada do tracuá é terrível”.

No Meio do Pitiú

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A música do álbum Banzeiro, de 2016, conta a história do namoro entre uma garça namoradeira e um urubu malandro. O encontro entre os personagens acontece na doca do Mercado Ver-o-Peso, “no meio do pitiú”, expressão que, segundo o Dicionário Michaelis, significa “cheiro forte, como o de peixe”. O urubu, que foi passear pelo arquipélago de Marajó, comeu de tudo, mas vivia numa “tristeza só” por sentir saudade de sua amada, do Ver-o-Peso e da sacanagem, pois é lá no mercado que ele é pop star, fica “bem na foto, na entrevista e na reportagem”.

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O Ver-o-Peso é um dos mercados mais antigos do país, que conta com feira livre, mercado público e uma pequena zona portuária. De acordo o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), trata-se de “um complexo arquitetônico e paisagístico de 25 mil metros quadrados, com uma série de construções históricas”. Foi inaugurado em 1625, no antigo Porto do Pirí, com o nome de Casa de “Haver o Peso” e foi se expandindo com o tempo. Em 1977 foi reconhecido como patrimônio pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Banzeiro

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Banzeiro, do álbum de mesmo nome, é uma das principais músicas de trabalho de Dona Onete. Regravada pela cantora Daniela Mercury em 2017, para o álbum Tri Eletro, a música viralizou.

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Banzeiro, de acordo com o Dicionário Caldas Aulete, trata-se de uma “série de ondas formadas pela pororoca ou pela passagem de uma embarcação a vapor e que quebram violentamente na praia ou nas margens do rio”. “Pororoca”, por sua vez, é um “fenômeno que ocorre próximo à foz de rios volumosos, como o Amazonas, e que consiste na formação de grandes ondas, que se deslocam com grande estrondo, destruindo tudo o que encontram em seu caminho”.

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Na música, Dona Onete convida o público para um banho de chuva, um banho de cheiro, para depois nos jogarmos no banzeiro. A letra traz duas outras expressões que remetem à flora do entorno do rio Amazonas, como a pataqueira e a priprioca. Ambas as ervas, de acordo com o site da Prefeitura de Belém, fazem parte da flora aromática do Ver-o-Peso, que é composta por 78 espécies, sendo 47 nativas e 31 exóticas.

A indústria de cosméticos tem se interessado pelo uso de ambas as ervas. Sobre a pataqueira, a Prefeitura de Belém diz que “empresas de cosméticos e fragrâncias têm mostrado grande interesse na comercialização do óleo de ‘pataqueira’, mas, talvez, sua exploração comercial seja dificultada pela incapacidade para manter um sistema de produção nas zonas úmidas da região”.

Jamburana

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Já a Jamburana faz parte do primeiro álbum da artista, Feitiço Cabloco, de 2013. O jambu, de acordo com o site da Prefeitura de Belém, é uma “planta cultivada na região norte do país, onde é utilizada como condimento culinário amazônico, principalmente para preparar o famoso ‘molho de tucupi’. As folhas e flores quando mastigadas dão uma sensação de formigamento nos lábios e na língua devido sua ação anestésica local, sendo por isso usada para dor de dente como anestésico e como estimulante do apetite”. É por isso que, na música de Dona Onete, o jambu “treme, vai descendo, vem subindo”, “chega até o céu da boca” e “a boca fica muito louca”.

Na letra, a artista cita diversos pratos típicos da culinária paraense que tem o jambu em seu preparo, como o pato no tucupi, o tacacá, o arroz paraense, a caldeirada no Pará e, até mesmo, o vatapá e o caruru, pratos típicos da culinária baiana que, na versão paraense, são “enfeitados” com jambu.

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* Colaborou Sarah Quines, repórter da

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