Busão das Artes chega ao Parque Municipal de BH

Crédito: Dani Gurgel.


Exposição itinerante leva ciências em artes visuais gratuitamente à população, de 5 a 29 de outubro, com obras assinadas por nomes como Vik Muniz, Jaider Esbell, Piero Manzoni, Ricardo Carvão, Ricardo Siri, Suzana Queiroga, Vivian Caccuri e Walmor Corrêa; o projeto apresenta o universo de fungos, bactérias e vírus de forma interativa e lúdica a crianças e adultos; depois de Belo Horizonte, a mostra segue para Ouro Preto e Congonhas

O pintor Paul Klee definiu arte como uma forma de “tornar visível o invisível”. A frase ganha outro sentido no Busão das Artes, um caminhão de 15 metros adaptado para receber experimentos interativos de abordagem científica e projetos de artes visuais, que chega a Belo Horizonte nesta quinta-feira, 05 de outubro de 2023. O Parque Municipal foi o local escolhido para receber o projeto, que ficará até o dia 29/10 na capital mineira, com entrada gratuita. O projeto visa a atender ao público circulante, bem como um amplo programa com escolas públicas e privadas do Estado, por meio de contatos com instituições de ensino, escolas públicas e colégios privados. A expectativa é repetir os índices de visitação alcançados no Rio de Janeiro em 2021 e 2022 e São Paulo em 2023, que atenderam mais de 40 mil alunos e visitantes espontâneos. Idealizado pelo curador e criador interdisciplinar Marcello Dantas, em parceria com o físico Luiz Alberto Rezende de Oliveira, um dos idealizadores e ex-curador do Museu do Amanhã, o Busão é um projeto realizado por Renata Lima, que dirige a Das Lima Produções, e a dupla Lilian Pieroni e Luciana Levacov, da Carioca DNA.

“O Busão das Artes nasceu da força de vontade da Carioca DNA e da Das Lima em educar, humanizar e sensibilizar, abordando dois temas urgentes e atuais: ciência e meio ambiente. Esse projeto acontece em praças e outros espaços públicos, gratuitamente, e está aberto a todos. Uma equipe capacitada de mediadores e arte educadores irá atender e aprofundar os conteúdos apresentados. Procuramos sempre buscar qualidade de vida e tornar a cidade um ambiente vivo”, afirma Luciana Levacov, sócia da Carioca DNA. A iniciativa apresenta duas vertentes: uma ambiental, que trata das bactérias e seu papel no ecossistema, e outra científica, abordando temas relacionados ao organismo humano. O propósito do Busão é ampliar a compreensão do público sobre o universo, o corpo humano, as bactérias (tanto as benéficas quanto as perigosas) e a relação dos indivíduos com o meio ambiente. Tudo isso com instalações artísticas e interatividade, mostrando como as manifestações da vida biológica se relacionam com tudo que há no planeta. Quem guia o visitante por esse universo tão rico e pouco explorado está invisível aos olhos: fungos, bactérias e vírus.

“Com esse projeto, buscamos democratizar o acesso ao conhecimento científico e biológico, mostrando a importância de conhecer o próprio corpo, as bactérias que vivem em nós e as que nos cercam. Respeitar as interações e processos do meio ambiente é essencial para a continuidade de vida terrestre”, ressalta Luiz Alberto de Oliveira.
Quem for ao Busão vai descobrir, com uma pitada de humor, que há mais de um quatrilhão de bactérias na Terra, dos quais 100 bilhões habitam o corpo humano, e 99,99% ainda sequer foram descobertas. Todos os seres vivos estão profundamente interligados, e suas existências se definem pelas linhas de fronteira e de intercâmbio entre cada ser. “A luta ancestral entre fungos, bactérias e vírus, que estão relacionados ao início e ao fim da vida. E é esse conceito que o Busão pretende divulgar. Não nos damos conta de que temos mais bactérias no organismo do que há estrelas no céu”, comenta Oliveira.

Com obras dos artistas Jaider Esbell, Piero Manzoni, Ricardo Carvão, Ricardo Siri, Suzana Queiroga, Vik Muniz, Vivian Caccuri e Walmor Corrêa, o projeto iniciou em 2021, no Rio de Janeiro, onde o Busão das Artes realizou cinco paradas até 2022. A mostra também passou neste ano por São Paulo, de onde vem direto para Minas Gerais.

Dantas destaca que, em razão da pandemia da COVID-19, as pessoas acabaram aprendendo mais sobre uma série de processos não perceptíveis a olho nu, mas que mudam o curso da história. Essa dimensão microbial, seja do fungo, da bactéria ou do vírus, está ativa e tem muito a nos dizer. “É preciso inocular na cabeça das pessoas a consciência sobre essas dinâmicas e usar a arte como plataforma para entender as forças que estão em constante relação”, afirma o curador.

Ao falar de fungos, bactérias e vírus, o Busão traz a diversidade para o centro da discussão, partindo do próprio conceito da existência. Oliveira lembra que, até 1995, os biólogos pensavam que uma floresta era uma coleção de árvores e que os indivíduos árvores se definiam pela sua singularidade, independente de tudo que os rodeava. Hoje, a ciência assegura que há uma rede de fungos subterrânea que conecta os vegetais e transforma essa coleção em uma sociedade, de tal maneira, que as árvores mais velhas cuidam das mais novas e as saudáveis auxiliam as doentes. E isso vale para qualquer ser vivo, de acordo com o físico.

“O Busão propõe uma experiência sensorial e cognitiva para levar informação adiante, mostrando como a diversidade integra todos os grupos. Nós tanto pertencemos a um ecossistema exterior, que fora da gente nos nutre e nos sustenta, assim como cada um de nós é em si um ecossistema. O Busão busca apresentar um conceito original do século XXI: a diversidade integra unidades. Não podemos falar apenas em seres diversos. Cada um desses seres é, em si, uma fonte de diversidade. O que estamos levando a São Paulo é, para nós, uma missão de responsabilidade social”, conta Marcello Dantas.

Também quem for ao Busão poderá conferir, por exemplo, fotos de umbigos feitas pelo artista Vik Muniz, mostrando que eles são únicos para cada indivíduo, e que assim tem um forte caráter identitário. Já o artista Jaider Esbell (1979-2021), indígena da etnia Macuxi, apresenta a obra “A vida vem da luz invisível — Os povos que moram no nosso corpo”. Produzido especialmente para o Busão, com 120×140 cm, o trabalho faz alusão à constante metamorfose que é a vida. “É um trabalho que faz pensar que, para além da nossa vida e do nosso pensamento, há uma infinidade de outras formas de vidas tão complexas e interativas no mundo, sem que nos demos conta”, refletiu Esbell em depoimento feito por ocasião da estreia no Rio de Janeiro.

Outra artista, Suzana Queiroga, propõe um mergulho no habitat das bactérias, com uma instalação que permitirá ao visitante interagir com uma simulação do ambiente desses seres microscópicos. Com recortes em placas de policarbonato alveolar em cores translúcidas, ela construiu uma obra que terá cerca de 270x189x210m. Suzana mesclou o conceito das placas de Petri — usadas para o cultivo e análise de microorganismos em laboratório — com a proposta de sua série “O mundo segue indiferente a nós”. Através da superposição de layers de papéis coloridos, a artista visual carioca trabalha a ideia de redes diversas, desde os neurônios até as tramas das cidades, os fluxos dos líquidos, a diversidade dos desenhos moleculares, a microbiologia e o tecido cósmico. “Meu desejo é tornar tridimensional o universo da microbiologia, especificamente o das bactérias, e trazer para a escala urbana e para a experiência do olhar. Quero trabalhar a ideia de sermos ecossistemas ambulantes em que convivem diversos reinos em harmonia, guerra e/ou colaboração”, explica a artista.

No Busão, também será possível saber quanto pesam os micróbios existentes no organismo de um indivíduo, através de uma balança que calcula o peso não-humano. Sem falar no trabalho do artista Walmor Correa, que envolve de forma bem-humorada sereias e pikaias. Pikaias? Sim uma espécie de animal marinho que viveu há cerca de 500 milhões de anos, no período Cambriano. Deste curioso cruzamento entre lenda e ciência, surge “O beijo da pikaia”. “Idealizei o encontro, em alto mar, entre duas pikaias; imaginei o contato das antenas e das bocas; imaginei até mesmo um beijo ou, numa abordagem menos romântica, a primeira troca de bactérias. É interessante pensar que, em dez segundos de um beijo, permutamos cerca de 80 milhões de bactérias. E, de acordo com especialistas, isso quase sempre é bom, porque as bactérias da chamada microbiota garantem um funcionamento melhor do organismo”, conta Corrêa.

Com tantos conceitos novos em discussão, é possível que o Busão deixe mais dúvidas do que certezas. Pensando nisso, na parte externa, haverá recipientes com perguntas, para que os visitantes possam refletir sobre o que viram e sobre a própria condição humana: “Só somos humanos, porque somos inumanos”, provoca Luiz Alberto.
Para os criadores do Busão, a ideia de circular por praças da cidade traz novos elementos de análise. Eles consideram estes espaços públicos um local de conversa em que, pela diversidade de seus frequentadores, há uma intensa troca bacteriológica. “Esta é a dimensão ética e política do Busão. Ao não colocar fronteiras entre a ciência e a arte, e criar diálogo com as pessoas, estamos também propondo uma revisão do próprio sentido de cidadania”, finaliza Oliveira.

Sobre as obras

Cada artista levou um pouco de sua essência para contribuir com o projeto, propondo experiência visuais e sensoriais para o público:

“A vida vem da luz invisível — Os povos que moram no nosso corpo” é a obra de Jaider Esbell (1979-2021), indígena da etnia Macuxi, e mostra a interação entre fungos e bactérias – uma das mais antigas colaborações e competições da natureza.

“Merde Essenciel” foi criada por Piero Manzoni (1933-1963) e fala sobre o destino das fezes na Natureza, ao tornarem-se um ambiente de nutrientes e bactérias que impulsionam novas vidas enquanto preservam sua identidade biológica.

“Como conversar com árvores”, de Ricardo Carvão, é composta por esculturas de materiais reutilizados que mostram como as substâncias atravessam e se transformam dentro de cada célula do corpo, bem como nas árvores.

“Polonizando ideias” é a de Ricardo Siri, que traça um paralelo entre os humanos e as abelhas a partir da biologia e da essencial arte de polinização, permitindo que o ciclo reprodutivo das flores seja completado.

“Curiosar”, de Suzana Queiroga, traz uma experiência tridimensional dos corpos se entrelaçando com camadas de culturas bacterianas em escala humana.
“Umbigos” é a mostra de Vik Muniz, com a mais completa biometria de um ser humano: a microflora do umbigo (mais identitária do que qualquer outra forma de tornar o indivíduo único).

“Sesmaria Soundsystem”, de Vivian Caccuri, é um sistema de som modelado puramente a partir de rapadura obtida da cana-de-açúcar, reinterpretando derivados da cana em mídia de reprodução de som que ecoam barulho das folhas da cana, das queimadas e dos insetos que gravitam em torno do material.

“Pikaia” é a instalação de Walmor Corrêa, que oferece a imagem do beijo imaginário da Pikaia gracilens – animal marinho extinto que viveu há 505 milhões de anos, no período Cambriano, na forma de cartazes e adesivos.

Sobre Luiz Alberto Rezende de Oliveira

Físico, doutor em Cosmologia, foi pesquisador do Instituto de Cosmologia, Relatividade e Astrofísica (ICRA-BR) do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF/MCTI), onde também atuou como professor de História e Filosofia da Ciência. Professor, palestrante e consultor de diversas instituições, foi curador do Museu do Amanhã do Rio de Janeiro.

Sobre Marcello Dantas

Criador interdisciplinar, trabalha na fronteira entre a arte e a tecnologia, produzindo exposições, museus e múltiplos projetos que buscam proporcionar experiências de imersão por meio dos sentidos e da percepção. Esteve por trás da concepção de diversos museus, entre os quais o Museu da Língua Portuguesa e a Japan House, em São Paulo; o Museu do Homem Americano e o Museu da Natureza, no Piauí; e o Museu do Caribe, na Colômbia. Assinou a curadoria de exposições de artistas estrangeiros de renome como Ai Weiwei, Anish Kapoor, Jenny Holzer, Michelangelo Pistoletto, Peter Greenaway, Rebecca Horn, Bill Viola e Laurie Anderson. Foi também diretor artístico do Pavilhão do Brasil na Expo Shanghai 2010; do Pavilhão do Brasil na Rio+20; e da Estação Pelé, em Berlim, na Copa do Mundo de 2006. Integra o corpo de curadoria da Bienal de Vancouver desde 2014.

 

SERVIÇO

Busão das Artes em Belo Horizonte
Local: Parque Municipal – Largo do Sol
Data: 05 a 29 de outubro
Horário de funcionamento regular: Quinta à domingo, das 9h30 às 17h
Horários especiais para visitas agendadas de escolas
Entrada gratuita
Mais informações: www.busaodasartes.com.br | @busaodasartes
Link de fotos: https://drive.google.com/drive/folders/1BiHeVdVdLD7T0b8OGej8dZVt-g-bhqeR?usp=share_link

Ouro Preto – Praça Cesário Alvim – 8 a 18/11
Congonhas – Praça Antônio Borges de Souza – 22/11 a 02/12

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