As escolas da rede de ensino fluminense deverão fazer, anualmente, uma campanha para prevenir e combater a automutilação. A determinação está na Lei 9.699/22, sancionada pelo governador Cláudio Castro e publicada no Diário Oficial de hoje (30).
A Campanha Estadual de Prevenção e Combate à Automutilação deverá promover palestras educativas, informativas e de conscientização ao longo do ano letivo, bem como divulgar medidas que podem ser adotadas para prevenir e combater a automutilação de crianças e jovens. A lei também prevê que sejam distribuídas cartilhas informativas sobre o tema.
De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 20% dos jovens brasileiros se automutilam, o que representa 14 milhões de pessoas. A Secretaria de Estado de Educação está autorizada a firmar convênios para que a lei seja cumprida. O Poder Executivo deverá regulamentar as normas complementares necessárias.
A deputada Martha Rocha (PDT), autora da lei e presidente da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), informou que, em audiência pública realizada pela comissão, os deputados constataram que a segunda maior causa para procura da rede pública de saúde por adolescentes tem relação com a saúde mental, que foi afetada pela pandemia de covid-19.
“Essa lei retrata uma observação que tivemos dentro da rede de educação, que é o sofrimento psicológico desses adolescentes. A automutilação é uma dura realidade na vida deles”.
Emergência médica
Falando à Agência Brasil, o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Antonio Geraldo da Silva, avaliou que esse tema “é uma emergência médica”. Segundo ele, a Lei federal 13.819, que trata da prevenção da automutilação e do suicídio, já preconiza isto.
“É preciso apenas que [essas campanhas] sejam feitas por técnicos capacitados”.
Atualmente, informou ele, o suicídio é a segunda maior causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos no mundo, de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS).
“Essa estatística é muito alarmante e deve ser alvo de preocupação de todos os governantes”.
Para o presidente da ABP, leis como a sancionada pelo governador fluminense podem ser consideradas grandes avanços na área de prevenção ao suicídio no Brasil, “pois ao serem criadas estratégias de prevenção como as impostas pela nova lei, conseguimos fortalecer a luta em defesa da saúde mental pública de qualidade para todos”.
Epidemia
O professor de psiquiatra da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC RJJ), Jorge Jaber Filho, ressaltou que a iniciativa, além de importante, é oportuna, porque esse problema é cada vez mais comum na população infantojuvenil, especialmente entre o sexo feminino.
“Praticamente uma epidemia, que pode evoluir para tentativas de suicídio, algumas graves. Campanhas anuais promovidas pelas secretarias de Saúde e Educação podem ajudar a reverter esse quadro, com foco tanto na prevenção quanto nos possíveis tratamentos. Elas devem incluir os pais, pois muitas vezes os sinais surgem em casa; e quanto mais cedo forem detectados, melhor”, afirmou.
Segundo o professor da PUC-RJ, a automutilação é muito comum em portadores de transtorno de personalidade borderline, cujo diagnóstico só é dado a pessoas com mais de 18 anos; e em pessoas com distúrbios como ansiedade, depressão e o chamado transtorno desafiador.
O tratamento utiliza medicação, mas é essencialmente psicoterapêutico, com psicólogos e outros profissionais, que trabalharão o lado emocional. “Os remédios estabilizam o paciente e permitem que as outras terapias façam seu papel, atacando o problema em sua verdadeira origem”, completou.