Centros de Referências da Assistência Social (CRAS) de Belo Horizonte recebem o espetáculo João-de-Barros

Fotografia – Kawane Gomes.


Atravessada pela obra do poeta Manoel de Barros e pelas memórias infantis do artista Charles Valadares, montagem tem como proposta refletir sobre o fazer teatral para as infâncias e levar o teatro para equipamentos públicos localizados em regiões periféricas de Belo Horizonte. As apresentações acontecerão de 6 de junho a 19 de julho em 13 CRAS. A entrada é gratuita

 

O artista e dramaturgo mineiro Charles Valadares leva ao Centros de Referências da Assistência Social (CRAS) de Belo Horizonte o seu espetáculo “João-de-Barros”. Treze unidades receberão o projeto, que nasce da conversa entre a obra poética do brasileiro Manoel de Barros e as memórias infantis do artista, que assume a dramaturgia, concepção e atuação neste trabalho cênico. Desse encontro, surgiu a fábula de um menino que inventou o mar no quintal de sua casa, navegou por ele e descobriu uma terra governada por um rei opressor. A partir de sua viagem imaginativa, o menino muda o curso da história desse povo.

 

As apresentações terão início no dia 6 de junho e seguirão até o dia 19 de julho, abertas ao público (gratuito, por de chegada). O espetáculo irá percorrer pelos CRAS: Arthur de Sá (dia 6.6, às 14h30), Granja de Freitas (13.6, às 14h), Vila Cemig (14.6, às 14h), Mantiqueira (20.6, às 14h), Havaí Ventosa (21.6, às 14h), Vila Maria (27.6, às 14h), Alto Vera Cruz (28.6, às 14h30), Confisco (4.7, às 13h30), Zilah Spósito (5.7, às 14h), Rita de Cássia (11.7, às 14h), Jardim Felicidade (12.7, às 14h), Vila Antena (18.7, às 14h30) e Petrópolis (19.7, às 14h). Este projeto é realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte e patrocínio da MGS – Minas Gerais Administração e Serviços S.A. Projeto Nº 0278/2020.

 

Em cena, Charles Valadares (re)cria e (des)constrói imagens poéticas ao modelar seu corpo e voz no espaço, que ressignifica objetos e suas memórias pessoais em prol da coletiva e, assim, revela o menino que ainda há no homem e a infância que habita em cada um de nós. “Enquanto fábula, eu trago a história do menino João, que se mistura às minhas memórias. A partir dessa narrativa criada pelo meu imaginário na infância, eu compartilho com o público a energia da brincadeira, a possibilidade do “faz de conta” enquanto matéria prima do espetáculo e como um importante elemento na vida das crianças. A peça dialoga com a energia do brincar, que vai ao encontro do meu trabalho como pesquisador sobre o teatro para as infâncias”, explica Charles Valadares, que é artista, dramaturgo, pesquisador e professor de teatro.

 

Além de ter a obra de Manoel de Barros e as memórias de infância de Charles Valadares como material criativo, o processo de construção do espetáculo contou com uma prática próxima da experiência etnográfica: horas de observação e convívio com crianças em aulas de teatro, ministradas pelo artista, onde ele pode perceber o modo engajado, entregue e inteiro das crianças ao serem envolvidas numa prática criativa, mergulhada em brincadeira e inventividade. “O espetáculo João-de-Barros nasce de três situações: das minhas memórias na infância, das minhas experiências no teatro para crianças e do atravessamento da obra poética. A partir de um fragmento da minha memória de infância eu desenvolvi uma pequena narrativa e fui trazendo elementos do que eu observava durante as minhas aulas de teatro para crianças, da forma como elas brincam de “faz de conta” e como esse “faz de conta” tem muito do fazer teatral. Essa é uma característica presente também no trabalho do Manoel de Barros, muitas das suas poesias são reflexos de suas memórias de infância e das infâncias dos seus filhos. Assim, a pesquisa para a criação de João-de-Barros tem, entre os seus propósitos, pensar o teatro para as infâncias”, conta Charles Valadares.

 

Charles observa que a cena belorizontina possui uma extensa produção teatral voltada para criança, mas que se pauta na reprodução das fábulas infantis já conhecidas e na repetição de fórmulas prontas. “Apostamos no espetáculo como forma de veicular e de criar estratégias de multiplicação desse outro modo de compreender “criança e arte”, que tem o brincar na infância como matéria-prima. Enxergamos neste caminho de pesquisa e criação diferenciais que são ofertados ao público-alvo da circulação. Essa via vai na contramão da indústria cultural do brinquedo e aposta na simplicidade como potência.”

 

“João-de-Barros” dialoga acerca de uma infância inventiva, na qual a criança com seu potencial criativo elabora sua brincadeira a partir da manipulação e ressignificação de materiais. Essa representação do brincar é muito forte na narrativa que traz, em cena, uma série de brinquedos-sucata que são manipulados pelo artista pelo durante todo o espetáculo. Materiais simples, que geralmente são descartados como inúteis (retalhos de tecidos, potinhos de iogurte dos mais variados formatos, tampinhas de garrafa, caixas e rolos de papelão, latinhas, entre outros), mas que surgiram como um caminho potente para Charles Valadares compor suas invencionices. “Optamos por dar luz à noção de uma infância que pode ser vivida no quintal de uma casa ou no corredor de um prédio, que não se limita em alimentar a indústria cultural dos brinquedos infantis para que o “faz de conta” aconteça. Eu conheci as possibilidades dos brinquedos-sucata durante a graduação, a partir do contato com a obra da professora da UFMG Marina Marcondes Machado, uma estudiosa do teatro para as infâncias e das relações do teatro com a educação. O espetáculo retrata a força desse elemento simples, do brinquedo-sucata, rico em imaginação e ficcionalização nas mãos de uma criança”, explica o artista.

 

A escolha do brinquedo-sucata como principal recurso da composição cênica reflete também o modo singelo, a simplicidade e delicadeza da poesia manoelina. O poeta afirma, sem hesitar, que “tudo aquilo que nossa civilização rejeita, pisa e mija em cima, serve para a poesia”. Seus escritos exaltam as pequenas coisas e seres que rastejam, conversam com uma infância de pés descalços, de relação próxima com a terra, com os bichos, com brincadeiras inventivas a partir de materiais doados pela natureza ou desprezados pela humanidade. “Levar o brinquedo-sucata como principal elemento cênico para dentro do espetáculo conversa com a obra do Manoel Barros, que é um poeta que escreve sobre o simples, mas de uma maneira muito profunda”, comenta Charles Valadares.

 

O cenário do espetáculo também dialoga com a simplicidade dos objetos manuseados pelo artista. Na busca por aliar discursividade cênica e os atravessamentos oriundos da inspiração literária de Manoel de Barros, Charles Valadares optou por uma encenação simples, adaptável a espaços diversos, que não se limite à recursos técnicos específicos e complexos do teatro, e que privilegie o essencial: o encontro entre espectador e obra artística. Outros aspectos dialogam com essa simplicidade: o figurino é composto por peças despojadas e não são utilizados artifícios de maquiagem para esconder a barba no rosto ou a adultícia do ator.

 

Além de provocar a reflexão sobre o fazer teatro para crianças, “João-de-Barros” também tem como proposta levar o teatro para espaços que comumente não recebem apresentações teatrais. Desde a sua estreia, a montagem percorreu diversos espaços da periferia de Belo Horizonte, por vilas do Anel Rodoviário e foi apresentada em escolas públicas. Lugares que para Charles Valadares “serviram de um grande laboratório para o aprimoramento do trabalho”. A atual circulação do espetáculo segue com a missão de possibilitar o direito ao acesso aos bens culturais às comunidades que estão localizadas em áreas vulneráveis socialmente. “A arte e outras práticas culturais são de fundamental importância para o fortalecimento do vínculo entre as pessoas. Sendo assim, uma das faces da nossa escolha pela circulação do espetáculo se origina no intuito de contribuir para o usufruto e fortalecimento desses espaços. Escolhemos os CRAS para essa circulação porque enxergamos nos espaços um diálogo que vai ao encontro com o meu desejo “político” enquanto artista de promover o acesso ao teatro em lugares que estão fora do centro urbano da capital, e uma sintonia com os primeiros passos do processo criativo do espetáculo. Nós queremos ocupar espaços que são do povo e para o povo, queremos conversar com essas pessoas e levar o teatro até elas”, afirma Charles Valadares.

 

A estrutura do espetáculo possibilita que o trabalho chegue a espaços que não foram feitos para serem ocupados pelo teatro. O João-de-Barros possui uma encenação totalmente adaptável, por sua simplicidade dramatúrgica e material, que não dependem de uma estrutura muito elaborada enquanto luz, palco e som. “Sabemos que os equipamentos do CRAS não foram elaborados para receber apresentações teatrais. Mas a forma simples como o João-de-Barros foi criado e é apresentado oportuniza a não dependência de especificidades técnicas complexas do teatro para sua realização. A experiência está muito mais no compartilhamento das minhas memórias e histórias, na relação com os espectadores, do que nos grandes elementos que compõem uma estrutura teatral”, sublinha Charles Valadares.

 

CHARLES VALADARES

É artista, pesquisador e professor de Teatro. Graduado em Licenciatura em Teatro pela UFMG (2009-2014). É Mestre (2017-2018) e Doutor (2020-2024) pelo Programa de Pós-Graduação da Escola de Belas Artes (PPGARTES). É Coordenador Geral, desde 2022, da Associação Casa de Gentil – Culturas e Convívios, uma organização da sociedade civil (OSC), localizada em Raposos-MG, que desde 2012 se propõe, e tem como objetivo, realizar e fomentar ações que entrelaçam arte, educação e culturas, através de diferentes propostas. Em 2022, transformou sua dissertação de mestrado em livro, sob o título “Teatro é infância e memória: o menino que há no homem”, publicado pela editora Javali. Como professor de teatro, ministrou oficinas e cursos para crianças, adolescentes, jovens e idosos, em espaços formais e informais. Como artista-pesquisador, investiga as relações entre teatro e infância, a partir da pedagogia teatral e criação cênica, onde busca se aproximar dos modos de ser e estar da criança, por meio de escuta, convívio e inventividade.

 

FICHA TÉCNICA

Concepção, dramaturgia e atuação: Charles Valadares

Orientação dramatúrgica, operação de som e mediação da roda de conversa: Raysner de Paula

Orientação visual: Luiz Dias e Helaine Freitas

Orientação no desenho de cena e movimento: Fabrício Trindade

Produção: Vânia Silvério

Fotografia: Kawane Gomes

Designer gráfico: Daniel Carvalho

Mobilização social: Rogério Gomes e Nego Dê

Intérprete de Libras: Dinalva Andrade (BH em LIBRAS)

Assessoria de imprensa: Cristina Sanches – CS Comunicação e Arte

Gerência Executiva: Sinara Teles

 

 

 

SERVIÇO

Espetáculo “João-de-Barros”

Circulação pelos CRAS

GRATUITO

 

Arthur de Sá (dia 6.6, às 14h30), Granja de Freitas (13.6, às 14h), Vila Cemig (14.6, às 14h), Mantiqueira (20.6, às 14h), Havaí Ventosa (21.6, às 14h), Vila Maria (27.6, às 14h), Alto Vera Cruz (28.6, às 14h30), Confisco (4.7, às 13h30), Zilah Spósito (5.7, às 14h), Rita de Cássia (11.7, às 14h), Jardim Felicidade (12.7, às 14h), Vila Antena (18.7, às 14h30) e

Petrópolis (19.7, às 14h)

 

Classificação: Livre . Duração: 45 minutos

 

Informações: (31) 99410-7068

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