Precarização, salários aviltados e falta de internet banda larga: o triste choque de realidade de uma universidade pública em tempos de pandemia
Os docentes da Universidade Estadual do Norte Fluminense estão em uma das únicas, senão a única, categorias profissionais do serviço público estadual que trabalham sob o regime de Dedicação Exclusiva. Este regime lhes impõe a impossibilidade de possuir outras fontes de renda, sob pena de demissão.
Apesar disso, eles amargam mais de 5 anos de salários congelados, além de não estar tendo honrado ao longo desse período os direitos garantidos pelo Plano de Cargos de Vencimentos (PCV), especificamente no tocante aos enquadramentos e progressões em função de mérito e tempo de serviço.
Agora, em meio à pandemia da COVID-19, os docentes da Uenf tiveram suspensos os pagamentos de adicionais de insalubridade e periculosidade em função da alegação de que não estavam sendo expostos aos riscos que garantem o pagamento desses adicionais. Curiosamente, os docentes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) que também tiveram esses adicionais suspensos, acabam de ter o pagamento dos mesmos retomado, e de forma retroativa.
Tal fato consiste em um flagrante tratamento diferenciado, e vem gerando forte descontentamento entre os que tiveram seus salários reduzidos, sem que a reitoria da Uenf que disponha a oferecer qualquer explicação sobre o tratamento diferenciado que foi dado à Uerj.
Mas seguindo o que diz a Lei de Murphy que atesta que “não há nada que esteja tão ruim que não possa piorar”, os docentes se vêem diante da obrigação de oferecer uma modalidade não prevista na instituição em meio à pandemia da COVID-19: o chamado “ensino remoto”.
Um dos problemas para que o ensino remoto seja oferecido na Uenf é que a universidade possui uma rede de internet que mal comporta o envio e recebimento de e-mails, que dirá o tráfego intenso que a oferta de disciplinas via remota irá demandar.
Desta forma, o que está implícito em uma eventual oferta dessa modalidade de “educação remota” é que os custos adicionais que isso demandará deverão sair dos bolsos dos docentes, os mesmos que estão com salários congelados e sem o pagamento de direitos garantidos pelo PCV da Uenf.
Outro aspecto que deveria estar merecendo atenção, mas aparentemente está também sendo deixado para que os docentes se virem como puderem, é que já se sabe que nem todos os estudantes, tanto de graduação como de pós-graduação, possuem acesso a serviços de internet que lhes garantam atender as aulas remotas.
Em levantamentos já feitos na Uenf, já até se sabe que uma parcela significativa daqueles que possuem acesso à internet apenas via telefones celulares. Tal dado indica que haverá um número significativo de estudantes que simplesmente não terão como acessar a educação remota que será oferecida no lugar do ensino presencial no qual esses mesmos estudantes estão matriculados, mas temporariamente impedidos de frequentar por causa da pandemia da COVID-19.
Não fossem esses detalhes suficientes, os docentes receberam recentemente um convite para participarem de um vídeo aula cujo título é “Videoaula: A experiência docente e o potencial das aulas remotas”.
A curiosidade fica por conta do fato de que as universidades estaduais e federais cujos docentes estão sendo convidadas para este evento realizado por uma empresa pertencente ao município do Rio de Janeiro, sendo que essas mesmas instituições de ensino superior participam do “Consórcio Centro de Educação Superior à Distância do Estado do Rio de Janeiro” (Cederj) que há duas décadas oferece a modalidade de ensino à distância (EAD) por meio de pólos regionais existentes em todas as regiões do estado do Rio de Janeiro.
A única conclusão possível é que a MultRio tem algum tipo de conhecimento sobre treinamento de docentes para educação remota que o Cederj nunca foi capaz de desenvolver, apesar de sua longa experiência na modalidade EAD. Ou é isso, ou eu não sei.
De toda forma, os docentes da Uenf terão, em meio à pandemia, de se defrontar com questões bastante sérias sobre a qualidade do ensino que poderão oferecer na forma remota. E, de quebra, com um inevitável aumento das despesas que aparentemente decorrerão da oferta de uma modalidade que sequer existe formalmente na Uenf, sem que existam sequer regras claras para como isso deverá ocorrer. E durma-se com toda essa precarização.
Por: Marcos Pedlowski – Opinião