Opinião: ‘fake news’ e o mundo



O grande problema disso tudo está na falta de qualquer tipo de controle sobre como as pessoas estão se informando

[Jornalista & Sociólogo] – Felipe de Jesus

O Brasil e o mundo foram tomados nos últimos anos, mais precisamente do ano de 2015 para cá, pela avalanche de informações falsas postadas na internet, ou as popularmente conhecidas “fake news” que abordam variados assuntos, sejam eles de política, economia, saúde e até mesmo fofocas de celebridades, que hoje, incrivelmente e infelizmente, se tornaram mais importantes para entreter a população, do que notícias sérias e que podem mudar a vida e o rumo da sociedade mundial! No entanto, o grande problema disso tudo está na falta de qualquer tipo de controle sobre como as pessoas estão se informando. As fake news se tornaram um problema em ascensão, já que de um lado, a sociedade, por não ter muito tempo para checar o tipo de informação que consome, acabam se entregando a “boatos” através das Redes Sociais como: Facebook, Instagram, Twitter, WhatsApp e outras redes.

Assim, ao invés de consultarem o fato em sites de veículos ligados a imprensa tradicional (sejam eles nacionais ou mesmo regionais) ou mesmo portais de notícias de pouco conhecimento público, mas com profissionais gabaritados, ou seja, comprovadamente formados no curso superior de “Comunicação Social: Jornalismo” e geralmente registrados em “Associação ou no Conselho de Classe de Profissão”, dão margem para publicações sem fundamento, sem fontes conhecidas e replicadas por pessoas sem nenhum tipo de formação ou experiência na responsabilidade que traz uma matéria, nota, reportagem escrita ou vídeo. Valendo-se lembrar que todas esses tipos de publicações precisam ser apuradas antes de serem levadas a público. Isso se chama responsabilidade e pode ter consequências sérias para quem acha que pode publicar o que quiser na internet, apenas pelo fato de ter um celular na mão.

Quando falamos da responsabilidade civil do agente, tratamos da gravidade que um fato pode ter, caso seja publicado sem nenhum tipo de checagem correta. Durante a pandemia, por exemplo, tivemos várias notícias sobre a Covid-19 e algumas, tendenciando, infelizmente, para posicionamentos políticos e interesses partidários. Desta forma, a população que deveria ser bem informada a cerca de um “vírus invisível, mas existente”, foi jogada de lado, sem ter uma orientação mais concreta a respeito da gravidade ou dos cuidados com a doença. No quesito mortes, uma notícia a respeito de “covas cavadas sem mortos”, foi viralizada na internet, mas desmentida logo em seguida.

No mês de maio do ano passado, Belo Horizonte se tornou notícia nacionalmente através de um vídeo, onde a senhora Valdete Vanco (que teve seu nome publicado em vários portais de notícias de relevância do país), disse que vários caixões foram enterrados com papelão e pedras, em Belo Horizonte (MG). Ou seja, sem corpos dentro.

No vídeo ela afirmava que essa era a realidade na capital mineira: “sabe o que tem dentro do caixão? Pedra e Madeira”. No entanto, nem Valdete Vanco que gravou o vídeo, tão pouco as pessoas que escreveram ou compartilharam as mensagens através das Redes Sociais, apresentaram provas a respeito do caso. Assim, como não havia nada que provasse o que disse no vídeo, a acusação acabou se tornando gravíssima chamando a atenção da Polícia Civil que abriu investigação pedindo ajuda a população através de um comunicado: “Quem tiver informações sobre essa mulher, é importante denunciar no 181”, informava o comunicado da corporação.

Já a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) também já tinha informado que o vídeo era falso. “A pessoa sugere que caixões de vítimas de covid-19 estão sendo desenterrados nos cemitérios da capital. São informações sem fundamento. A Procuradoria Geral do Município está analisando as imagens para adotar as medidas legais cabíveis”. Logo em seguida ela se apresentou a Polícia Civil tendo que responder ao inquérito policial por ter espalhado fake news sobre caixões que seriam de vítimas de Covid-19 na capital mineira.

Mesmo assim, ela gravou um vídeo se desculpando pela divulgação, mas já não adiantava mais: “Queria pedir desculpa, pedir perdão para o prefeito de BH, para o governador do estado e para as famílias que se sentiram entristecidas. Não era minha intenção”. Já os delegados responsáveis pelo caso informaram que ela poderia pegar até nove anos de prisão e ainda pagar uma multa pelos crimes de calúnia e difamação contra autoridade pública e pela contravenção penal por provocar tumulto ou pânico. “A Polícia Civil, com a investigação e combate a essas “fake news”, quer alertar que esse tipo de conduta pode trazer repercussões muito graves tanto na esfera criminal quanto na esfera cível. A análise do vídeo nos traz, num primeiro momento, a possibilidade da prática do crime de denunciação caluniosa, difamação de autoridade pública, através de meio em que propagação é maior, e também a contravenção penal de provocação de tumulto ou pânico”, disse a época o delegado Wagner Sales”. Em agosto a Polícia Civil concluiu o inquérito do caso e Valdete responde (livremente até a decisão da Polícia) por um crime e uma contravenção, ou seja, Denunciação Caluniosa e Contravenção Penal por causar pânico e tumulto.

Outro caso chamou a atenção das autoridades policiais e governo no país durante a pandemia. No Mato Grosso, um homem de 26 anos foi detido por espalhar fake news em um aplicativo de mensagens sobre a Covid-19 em Carlinda, a 724 km de Cuiabá. O município que não tinha nenhum caso de Covid-19 se assustou com a fato. Com isso, a Polícia Militar foi acionada pelo secretário de Saúde de Carlinda, Darci Marques de Brito, que informou que havia recebido pelo WhatsApp a informação falsa sobre a propagação do novo coronavírus na cidade. Em diligência, os policiais localizaram o suspeito no Bairro Cristo Rei e o homem justificou que ouviu as informações na rua e decidiu fazer a postagem, mas não soube dizer quem teria contado a fake news na cidade.

Assim, todos os dois casos deixam claro que o simples ato de publicar confere a uma responsabilidade civil ao agente, já que pode atingir a sociedade como um todo. Sabemos que o direito à liberdade e à comunicação devem ser respeitados. Assim, mesmo que no ambiente virtual, medidas de caráter a coibir determinados atos pode ser tido por censura ao exercício da liberdade de expressão. No entanto, dentro do âmbito legal e jurídico, essa liberdade e livre acesso e geração de informações nas quais os atores sociais uma vez se apresentam com emissores, outra como receptores, ou vice-versa, com a possibilidade de alteração deste conteúdo, traz uma enorme insegurança sobre sua a veracidade para quem lê. Assim, quando falamos no uso indevido com cometimento de abusos que podem violar e atingir os direitos da personalidade, gera a responsabilidade para aquele que comete o ilícito.

Quanto a responsabilização do Estado no quesito “fake news”, já existem medidas para tentar acabar com esse tipo de situação. Em pelo menos cinco assembleias legislativas do país, o tema já é tratado desde maio desse ano, como urgência. Em São Paulo, o deputado estadual Thiago Auricchio (PL) propôs multa de até R$ 5,5 mil a quem divulgar fake news sobre o coronavírus, já que para ele a desinformação é perigosa em qualquer momento, mas, no quadro atual se torna mais grave pois pode custar vidas. Mas além disso, projetos similares tramitam nas assembleias do Piauí, Amazonas, Espírito Santo e Bahia. Essa situação foi colada em pauta, principalmente no período de pandemia, exatamente pelos casos de fake news envolvendo a ação dos Estados frente à crise de coronavírus.

No Ceará, por exemplo, antes da aprovação da multa, a administração de Camilo Santana (PT) foi alvo de um boato que utilizava áudio falso para sugerir que o governador estaria usando a pandemia para desestabilizar o governo do presidente Jair Bolsonaro. O áudio em questão era atribuído a um suposto assessor do governo chamado Ricardo Certi, mas ele não consta da lista de servidores estaduais. De acordo com a Secretaria da Casa Civil do Ceará, o caso foi informado às autoridades para que seja investigado. Mas além disso, o o governador do Pará, (conforme notícia do jornal Estadão de maio deste ano), Helder Barbalho (MDB) revogou horas depois de sancionar, na sexta-feira passada, uma lei aprovada pelos deputados que permitiria ao Estado multar quem divulgasse informações e opiniões “sem comprovação de veracidade” com o objetivo de provocar desinformação ou para “manchar a honra pessoal de autoridades”. Mas a regra valeria também para a imprensa.

Já na Bahia, o governo estadual apresentou, um projeto sugerindo uma multa no valor de R$ 18,8 mil a quem divulgar informações falsas sobre pandemias. Valendo lembrar, que foram apresentados desde 18 de março na Câmara dos Deputados, ao menos seis projetos sobre punição a fake news. Em cinco deles, os deputados pedem a tipificação da disseminação de Fake News relacionadas a pandemias ou a riscos à segurança sanitária do país como crime no Código Penal. Ou seja, tudo para tentar acabar com a disseminação de notícias que podem afetar diversos setores, sejam eles da pólitica, economia, jurídico e sociedade civil como um todo.

Na mesma linha, o governador Rui Costa (PT) disse que textos produzidos por jornalistas e textos opinativos não podem ser considerados ilícitos. “Desconheço a polêmica criada de que nosso projeto para combater as fake news iria cercear a liberdade de expressão. Jamais existiu essa intenção. Mais do que nunca, o momento é da sociedade de unir para combater essa milícia digital que tanto mal tem feito ao nosso país”, comentou.

Já para Cristina Tardáguila, diretora adjunta da International Fact-Checking Network, entidade ligada ao Instituto Poynter que reúne mais de 80 organizações de checagem de informações, é um risco que o Estado faça regulamentação de um conceito que ainda não tem uma definição clara. Ela relata que experiências de regulamentação em países como Tailândia, Índia e Cingapura abriram brechas para violação de direitos humanos.

Para Cristina, os projetos e multas contra fake news podem levar a regulamentações com consequências graves, como o caso de Sulaiman, citado no início desta reportagem. “Já estivemos em países onde legislações foram aprovadas e que passaram a vivenciar situações de autocensura e de censura. É enorme a possibilidade de a América Latina replicar as falhas no combate à desinformação que aconteceram na Ásia.” “É uma pena que essa discussão, que merece um enorme debate democrático, esteja acontecendo num momento em que a conversa não está fluindo normalmente (por causa da pandemia do coronavírus). Qualquer tentativa de legislar sobre isso, neste momento, é oportunismo”, disse a diretora da International Fact-Checking Network.

Quando se trata do impacto das fake news no Direito Administrativo, falamos das consequencias que elas podem abarcar dentro da Administração Pública. Mas vale rememorar primeiramente a importância do Direito Administrativo na vida do cidadão, já que ele engloba, sobretudo, a regulação jurídica do poder administrativo – ou executivo – do Estado. Portanto, é o que dá forma e função a essa ponta da tripartição dos poderes e como dispõe o art. 2º da Constituição Federal de 1988, “são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Assim, as fontes, os conceitos, os princípios e as funções da Administração Pública e seus entes, para que sejam cumpridos os interesses sociais a dever do Estado. Mesmo assim, eles tem sido atingidos pela enorme onda das fake news, por isso, tem se tornado cada vez mais urgente, mecanismos para proteger a sociedade de abusos virtuais e, ao mesmo tempo, assegurar a liberdade de expressão.

A própria ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, a respeito da situação das fake news, dentro desse âmbito do Direito Administrativo, deu uma declaração sobre a importância em se informar por veículos de imprensa tradicional. “Nós mantivemos a confiabilidade da chamada mídia tradicional porque ela tem o cuidado da apuração. Estas mídias propiciam que se inventem situações que propagadas com rapidez não geram informações, geram informes”. Por essa preocupação, a CPMI das fake news foi criada com o objetivo de investigar a disseminação de notícias falsas nas eleições do ano de 2018. Ela que foi composta por 15 deputados federais e 15 senadores, teve como principal motivo, o fortalecimento da seriedade das informações e do respeito a democracia.  Ou seja, tudo isso para que a democracia não perdesse sua força e relevância de se manter como um tipo de organização social no qual o controle político é, teoricamente, exercido pelo povo. Assim, resultando em um sistema governamental que se forma pela livre escolha de governantes pela maioria da população, por meio de votação. Tudo isso seguindo a Constituição Federal.

Não podemos fugir que um dos problemas derivados da evolução da tecnologia, são as polêmicas “fake news” dentro do Direito Administrativo, principalmente por ela ter se tornado uma problemática proveniente da intensificação da comunicação pelas redes sociais na internet. Nos últimos tempos, principalmente em eleições, sejam em quais esferas forem: Legislativo, Executivo e Judiciário, vem afetando e gerando problemas sérios a essência da democracia brasileira, e consequentemente ferindo a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Ou seja, uma Democracia que emana do povo, exercido pelo povo e feito para o povo nos Estados Democráticos de Direito que todos conhecemos bem. Decisões tem sido tomadas a luz de todos, mas propagadas de forma errônea por cidadãos nas Redes Sociais. Assim, dando margem para suposições incertas e totalmente sem fundamento a respeito destes poderes.

Democracia 

Não é possível dizer que temos uma Democracia Brasileira efetivada a risca, já que mesmo seguindo os preceitos da Constituição, vem tendo seus princípios fundamentais feridos e lesados pelas fake news. No momento em que se tem um país populoso consumindo diversos tipos de conteúdo em uma grande escala, na internet e nas mídias, sem verificar sua real credibilidade e veracidade das informações, é muito possível que problemas relacionados a desinformação surjam. Quando a propagação de forma deliberada de informações falaciosas e sensacionalistas é tão livre assim, prejudica não apenas o cidadão, mas também a Administração Pública que em suas mãos, tem decisões sérias e totalmente ligadas a sociedade brasileira.

Ou melhor, com tudo isso acontecendo através da interferência das fake news no Direito Administrativo – Administração Pública, temos resultados devastadores à democracia Brasileira, como sua deterioração, além de a transformar em uma “baderna”, temas que deveriam ser tratados com total seriedade. Na verdade, as fake news prejudicam o efetivo exercício dos mais básicos direitos e garantias dos cidadãos que estão consagrados na Constituição Federal, ferindo diretamente a democracia e a transformando em algo que está longe de ser totalmente democrático.

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